COLUNA - Canto do Conto #02

Boa noite meus lindos!
Trazendo para vocês mais um texto da nossa Coluna - Canto do Conto!
Os textos são de autoria de Vanessa Santos. Ela é a autora do blog Mar de Letras.
Espero que gostem...


                         Realidade Ficcional

Quando crianças, somos programados a andar com muletas. Se tínhamos dor de cabeça, logo nossa mãe aparecia com a temida novalgina. Se caíssemos de bicicleta lá estava o nosso pai nos acudindo imediatamente com o merthiolate. E claro, se um mero soluço nos atacasse, rapidamente vinha nossa avó com suas simpatias pra nos aliviarmos desse incomodo. Tudo para evitar sentir o mal. Mas e quando a dor não é física? E quando for mental?  E quando for direcionada a nossa alma? Qual o paliativo? Qual a droga? Muitos, tem como escape o cigarro, outros a bebida alcóolica e alguns utilizam drogas ilícitas como método de superação de uma realidade fracassada ou simplesmente  realidade.
Tendo isso em mente peço gentilmente que não julgue o personagem.





Passa produto por produto na esteira. -Bom dia, bom dia. A compra deu R$154,90. Tem nota menor? Não? Aqui esta o troco. Não, não sei o preço do produto, mas vou verificar.  Vou chamar o gerente. Não se esqueça da notinha senhor!
Entre um cliente e outro, conversas com outras funcionárias são trocadas. Coisas rotineiras sobre a tragédia que é o transporte público e a miséria do salário no final do mês. Mais conversas, olhar ansioso para o ponteiro das horas, passar produtos na esteira e pesar os alimentos. -Não se esqueça da notinha senhora! Assim segue maquinalmente até a hora do almoço. Come sem sentir o gosto da comida, liga para a mãe e depois para o namorado. Tira um cochilo de dez minutos.
O horário à tarde passa mais ligeiro. Logo é seis horas. Parte do trabalho para o cursinho de inglês.- Hi! I am a girl. You are a boy. Verbo to be, dinâmicas e exercicios feitos. Nove horas. Chega em casa. Dá um beijo na mãe e nas irmãs mais novas. Fala com a avó na cadeira de rodas e deixa uma boa quantia em dinheiro para ajudar o seu pai a pagar algumas contas. Janta com a família, trava os mesmos assuntos e logo se despede para dormir. Quando vê a cama, não deita, se joga.
Analice, 22. Trabalha como caixa de mercado, oriunda de família classe média, possui três irmãs e um bom namorado.
Há coisas que são tão bestas que chegam a ser pesadas demais. A vida se torna um fardo pesado demais.

                                                          ...

Pequenas baratas rastejam pelo chão. Seringas e preservativos encontram-se jogados por todo o canto. A única luz do banheiro parece vacilar no ritmo da batida da boate. O cheiro de sexo exala pelo ar. Nas paredes há desenhos pornográficos e anúncios. E mais um era acrescentado:” Meu nome é Analice e quero você. Meu telefone é: xxxxxx. Enquanto escreve a porta dos fundos lentamente se abre. Um homem entra. Os dois desconhecidos se encaram, se tocam, se enlaçam e se entranham. Logo Analice não pensa mais na sua vida, na sua realidade. Nesse momento ela não é filha,neta,irmã,namorada ou caixa de mercado. 

Nesse momento não tem responsabilidades ou preocupações. È apenas uma mulher. Em questão de minutos  sensações alienantes apagam sua mente,proporcionando uma incontornável impressão de escape deste mundo  com traços de ficção. A verdade e o prazer do sexo a permite fugir da existencia ámorfica na qual é obrigada a viver. Sua mente se torna suave e seu corpo leve.
Assim seguia sua noite. Duas, tres,quatro. As seis da manhã, Analice volta para sua vida. Chega em casa,toma banho, tira um cochilo e põe seu uniforme. Dá um beijo na sua mãe e fala com sua avó na cadeira de rodas. Deixa determinada quantia de dinheiro para seu pai.

Passa produto por produto na esteira. Bom dia,bom dia. A compra deu R$12,35. Aqui o troco. Não se esqueça da notinha senhor...
Era só mais uma realidade em meio a tantas outras. Somente uma história no meio de tantas outras. Aquela vida noturna, somente ficção. Uma necessária ficção. Porque às vezes a vida é besta e pesada. Demais.

Bjus




Lia Christo:
Carioca da gema, romântica incurável, leitora compulsiva, perseguidora de sonhos, e louca pela vida!

8 comentários:

  1. Ler um texto bem escrito é tudo de bom. A medida que fui lendo fui vendo e absorvendo toda a rotina da Analice. Coisas rotineiras que não vemos que fazemos, ligamos no piloto automático e seguimos a vida. Delícia de coluna. Parabéns a Vanessa Santos. bju
    Eykler

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  2. Super profundo e intenso!
    Parabéns à Vanessa que conseguiu criar uma curiosidade em poucas linhas.

    Bjks

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  3. adorei o conto, adoro ler contos!!
    porém é tão dificil eu le-los, só assim mesmo!!

    beijos
    http://dailyofbooks.blogspot.com.br/

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  4. conto bem interessante, escrita firme, parabéns

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  5. Obrigada gente!Esse é um dos contos que mais gostei de escrever...

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